18 julho 2007

Filosofações sobre o acidente da TAM

Como todo o Brasil, estou muito triste com o acidente com o avião da TAM. Fiquei sabendo através do Dr. Venom, resumido no seguinte diálogo:


  • Venom - Caiu um avião em São Paulo, você soube?
  • Eu - Não...
  • Venom - Minha mãe ouviu e me falou.
  • Eu - Hmmmm... Foi onde, no interior?
  • Venom - Não, na capital.
  • Eu - Foi um monomotor?
  • Venom - Parece que foi um Boeing.
  • Eu - UM BOEING? Meu Deus...

Estávamos ontem indo encontrar o Márcio Lima, que está no Rio, de folga do trabalho dele, e tivemos que nos sentar na frente de uma televisão, no trailer onde comemos um sanduíche, para nos informar do fato. Infelizmente, foi no Jornal Nacional, mas isso não diminuiu a tristeza e a consternação que nos acometeu.

O prédio da TAM Express é meu velho conhecido, de idas e vindas de Congonhas. Ele era o meu ponto de referência, para saber que estávamos chegando ao aeroporto. Ao longo do dia (e até agora) estou com dor-de-cabeça (coisa rara para mim) e cheguei a embargar a voz uma ou duas vezes. Quem me conhece, sabe que não sou muito de ficar chorando... Mas fiquei pensando que poderia ter sido eu, fazendo o percurso, ou um amigo meu... 200 mortos, meu Deus!

Para variar, tive que sair de casa e ir resolver um monte de coisas. E passei boa parte do dia ouvindo a CBN e a Band News FM, que dedicaram a maior parte da programação à essa tragédia. Ouvi as entrevistas dos representantes da TAM, da ANAC, da Infraero, e os noticiários, que entrevistaram meteorologistas, especialistas em segurança aérea, engenheiros aeronáuticos, bombeiros... Claro, estou ouvindo também muita besteira vinda dos noticiários, e resolvi relatar algumas aí embaixo.


  1. Disseram que o avião voava com excesso de peso - O peso do avião era de 62,5 toneladas, e segundo os cálculos, ele poderia pousar na pista molhada de Congonhas com até 64,7 toneladas. Logo, ele estava dentro do peso.
  2. A solução para Congonhas é diminuir o tráfego aéreo - Bem, Congonhas já operou com 62 operações/hora, entre pousos e decolagens, mesmo antes da reforma (inacabada) da pista. Agora, ele está operando com 38 operações/hora, ou seja, com uma carga reduzida. Então, não é esse o caso. Além do mais, não foi um choque de aviões, ocasionado diretamente por causa do tráfego aéreo (como foi o acidente entre dois 747 nas Ilhas Canárias, em 1977).
  3. Disseram que o problema era a falta do grooving, que são as ranhuras na pista, para aumentar o atrito - Eu sou curioso, e sempre que posso, observo todo o procedimento de decolagem e aterrisagem. Lembrem-se que eu sou um "piloto frustrado". Quando o avião pousa, ele abre todos os flaps e ailerons (quando era criança eu sabia exatamente o que abria e o que fechava, hoje em dia não) para aumentar a área de resistência ao ar. E o avião pousa, em média, a 350 km/h. Feito isso, as turbinas são revertidas, à toda, para parar o avião na pista. Por último, as pastilhas de freio são acionadas, para parar o avião. Logo, a frenagem é a última coisa a ser usada para parar o avião. O atrito gerado pelo grooving (se é que existe) não ajuda em quase nada. O principal objetivo do grooving é o que coloquei no item de baixo.
  4. Também disseram que o problema era a pista molhada, e se tivesse o grooving, o acidente não teria ocorrido - Bem, vários aeroportos no mundo não tem ranhuras para drenar água, e o procedimento é que a pista seja fechada caso a lâmina d'água tenha mais do que 3 milímetros de espessura. Pois bem, 20 minutos antes desse trágico acidente, uma equipe da INFRAERO vistoriou a pista, e verificou que não havia lâmina d'água na pista. Logo, não tinha água o bastante para fazer o avião patinar. Se tivesse o grooving, seria possível um avião pousar na pista principal de Congonhas com um dilúvio na cabeça, se fosse preciso.
  5. Falaram em defeito do avião, e relembraram a TAM do acidente do Fokker 100, em 1996 - Well, o Fokker 100 é um balde de parafusos, e vale lembrar que essa maldita lata velha teve muitos problemas ao longo do seu percurso (acidentado). Descanse em paz, e longe dos pilotos e passageiros do mundo todo. A TAM ainda mantém alguns voando em percursos curtos e regionais. Por exemplo, aqui vai uma lista de acidentes que ocorreram com o Fokker 100. No blog do Marcos Lacerda, vai uma lista mais caprichada dos problemas que esse caixão voador teve, com um pouco mais de detalhes. Aliás, vale lembrar, um Fokker 100 teve problemas hoje (19/7) em Congonhas... Quanto ao Airbus, aqui vai a lista (desatualizada) dos acidentes do A320. Há uma grande diferença nesse caso, que é que o A320 é feito por uma empresa responsável e que não faliu... E a tecnologia avançou muito, em 10 anos. Logo, acho difícil que seja falha mecânica.
  6. Descaso da TAM, não divulgaram a lista de passageiros, que só souberam por uma rádio gaúcha, no meio da madrugada - Tem uma norma da ANAC que determina que a lista de passageiros só deve ser divulgada depois de ser vista e revista (pois sempre alguém troca de avião), e inicialmente só para os familiares, para depois ir para a imprensa. Segundo fiquei sabendo, não foi através de uma rádio gaúcha, como erradamente noticiou a Bandeirantes, mas sim através de um funcionário da TAM, que leu a lista no hotel onde os familiares estavam hospedados, à 1h30m. Aliás, acho que a rádio até noticiou, mas foi depois do comunicado da TAM. E não tem essa de que o sistema é computadorizado, demoraram porque quiseram, porque acreditem, o maior interesse da empresa é atender os familiares. Não exatamente por serem bonzinhos, mas sim porque a imagem dela está em jogo. A TAM pegou o espaço da VARIG e hoje é a maior empresa de transporte aéreo do Brasil. Logo, eles também não querem queimar a própria imagem. Além de, é claro, eles serem seres humanos, e estarem (como nós) consternados e tristes com o fato ocorrido.

Logo, baseado nisso tudo, eu fico com a hipótese de falha humana. O que é estranho, visto que o A320 é todo computadorizado, o piloto controla os computadores, que controlam o avião... Na minha opinião, baseado em tudo que ouvi, vi e li, é que: O piloto pousou rápido demais, mas não conseguiu parar, e resolveu tentar arremeter, para uma nova investida. Só que ele não conseguiu. Por quê falo isso? Se ele tivesse derrapado, como muitos falaram, o avião teria caído na Av. Washington Luiz (que tem 2 lados, cada uma com 4 pistas), e não passado direto. O avião passou por um vão de 50 metros (pelo menos), antes de entrar no prédio da TAM Express. E só um carro foi afetado pelo avião: Um Corsa teve o teto levemente amassado. Para mim, o piloto não conseguiu arremeter. Além do mais, o aeroporto operou normalmente, com muitos (centenas) de vôos chegando e saindo ontem, e ninguém mais derrapou, bateu ou caiu.

Agora, alguns fatos:


  1. Congonhas não tem área de escape. Isso é assustador. Se um acidente igual ocorre no Galeão, em Cumbica, Santos Dumont ou em outros aeroportos, o piloto iria parar na grama (ou na água), e seria apenas um susto. Nesse link, achei uma lista de acidentes não-fatais e fatais em Congonhas, e dá para ver que Congonhas é um absurdo como aeroporto, assim como é o aeroporto de Hong Kong e alguns do Japão. Mas vocês pensam que é exclusividade nossa, de ter aeroportos encravados no meio das cidades? Nananinanão... Aliás, a última vez que pousei em Congonhas, fiquei assustado com os prédios que estavam perto do avião, as coberturas e suas piscinas, e o medo que senti era justificado: Estávamos muito perto dos prédios, e o aeroporto é no meio. A propósito, o aeroporto de Hong Kong é ainda mais assustador. Duvida? Clique aqui e se apavore.
  2. A primeira reforma em Congonhas foi feita agora. O aeroporto tem 50 anos de idade, e a primeira reforma foi agora! E nem terminaram a reforma... Faltou as ranhuras na pista principal, para facilitar a drenagem de água. Aliás, gastaram R$ 400 milhões em um terminal novo, e R$ 20 milhões na pista. Mesmo assim, só reformaram a pista DEPOIS de fazerem o terminal. Na imprensa, criticaram um bocado a situação da pista, e depois de muito custo, a reformaram. Mas não finalizaram a obra.
  3. A aviação brasileira vive um inferno astral. Inferno astral foi o termo mais simpático que eu consegui. Começou tudo com o acidente da Gol, que foi usado como gancho para mostrar a situação precária do Cindacta, e começou o que chamamos de caos aéreo. Quase 10 meses depois, e nada resolvido. O presidente exigiu data e hora para a solução, mas nada foi feito. E agora, outro acidente triste.
  4. Os governantes perderam grandes oportunidades de fecharem a matraca. A Ministra do Turismo foi falar do Programa Nacional de Turismo, mas falou a respeito da crise aérea: "Relaxa e goza". O Ministro do Planejamento disse que o caos aéreo "é uma coisa boa" - por causa do crescimento da economia (esse, incontestável). O Ministro da Defesa falou que "não existe caos aéreo" - e a mãe, vai bem? Lamentável.
  5. O avião pousou mais rápido do que deveria ter pousado. Segundo quem viu a fita, o avião pousou com velocidade maior do que a normal. Segundo essa breve entrevista colhida pelo PHA, 3 a 4 vezes mais rápido do que o normal. Então... Há um problema. Confira aqui o pouso do Airbus, e aqui uma simulação.
  6. Na CBN, forçaram a barra em alguns momentos. Embora a cobertura tenha sido mais completa do que a da Band News FM (com direito até a atropelar a Voz do Brasil para transmitir a entrevista dos representantes da ANAC e Infraero), houveram momentos desagradáveis. Um deles foi quando a repórter perguntou a um especialista sobre a existência do grooving, e da influência dele no pouso. O mesmo disse claramente que o grooving não influencia no aumento do atrito das rodas. A função do grooving é apenas a drenagem da pista, para espanto (audível) da repórter. O outro momento foi quando entrevistaram um dos responsáveis pelo setor de investigação de acidentes aéreos de Portugal, e nas três primeiras perguntas, forçaram a barra questionando "se o acidente vai arranhar a imagem da aviação brasileira", de formas diferentes. O português contornou e escapou pela tangente. Não aguentei a terceira pergunta, mudei de rádio antes do nojo tomar conta de mim.

Em tempo, criticaram que o presidente não foi falar sobre o acidente... Well, quem tem que se manifestar é a ANAC e a Infraero, não ele. Ele fez o que é certo da parte dele: Decretou luto oficial de 3 dias, e no Pan, todas as bandeiras foram hasteadas a meio-pau (não se pode somente a bandeira brasileira ficar a meio-pau e as outras não). Agora, curioso foi o governador de São Paulo, José Serra... Foi todo afoito falar a respeito do acidente. Engraçado, né? O aeroporto é jurisdição federal, mas ele se manifestou rapidamente. Agora o desabamento do Metrô (que é responsabilidade estadual), há pouco mais de 6 meses, ele não falou nada. E já tem gente da oposição dizendo que "a culpa é do Governo". A Folha de São Paulo (jornalzinho de m****) também já condenou o Governo. Ah, façam-me o favor, nem abriram as caixas-pretas e já declaram os culpados?

Bem, chega de falatório. Espero que isso aqui sirva para alguma coisa, além do meu desabafo, manifestação de dor e reflexões. Pelo menos uma eu tenho: Agora tenho dúvida se pegarei um avião que vá para Congonhas, ou que saia de lá...

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