19 fevereiro 2018

Sobre a intervenção militar no Rio de Janeiro

Há uma razão pela qual você separa os militares e a polícia. Um luta contra os inimigos do Estado, o outro serve e protege a população. Quando os militares se tornam ambos, então os inimigos do estado tendem a se tornar a população.

Comandante William Adama (Battlestar Galactica)

Militares também moram em comunidades, também podem ser corrompidos, também podem traficar armas para bandidos, também não estão satisfeitos com essa iniciativa do "desgoverno" federal... E eu já falei em venda de armas para bandidos? E pior, militares não são preparados para lidar com a violência urbana. Num Carnaval onde os índices de violência caíram (e não sou eu que digo, é o jornal Estado de São Paulo), bastou ocorrer arrastões no Leblon (bairro da classe muito alta carioca) para que víssemos esse circo.

Você sabe que algo está errado quando você lê o editorial do Estado de São Paulo (que é um jornal extremamente conservador), lê o jornalismo independente, alguns blogs de viés progressista... E todos dizem a mesma coisa, que essa intervenção não tem o menor sentido.

O Rio de Janeiro não está entre as 30 cidades mais violentas do país. Aliás, eu me assustei quando encontrei Fortaleza (Ceará) no meio da lista. É a capital com mais homicídios do país. E em nenhuma listagem, o Rio de Janeiro aparece entre as cinco, ou as dez capitais mais violentas do país. Se quiser saber mais, o Atlas da Violência 2017 está disponível aqui.

Voltando à intervenção, o pior é que eu duvido que esses dez meses vão dar em alguma coisa. Ao invés de investir nas Polícias Civil e Militar, em educação e nas comunidades em si, quem desgoverna está mais interessado em espetáculos midiaticos, para aparecer bem no Jornal Nacional (que ninguém vê). E não sou só eu que vejo isso como uma manobra do desgoverno, apenas. O Le Monde acha isto, o The Guardian também acha.

E quem vai sofrer mesmo é o pobre, o miserável, o morador de favela, aquele que já é sacaneado dia e noite por uma polícia violenta, corrupta e truculenta... Agora será por militares também.

E já que você veio até aqui, gasta uns minutos e veja esse vídeo. A entrevistada é uma professora da UFF, que pesquisa segurança pública. Ela entende mais disso do que eu.


E eu, que tinha esperança para 2018... Continuo tendo esperança. Mas está difícil.

PS: Aos poucos vou retomar o blog.

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15 junho 2013

Filosofações: Sobre os protestos recentes.

Comecei a escrever isso como comentário em um post de um blog que leio vez por outra (Pavazine), e a exaltação do que chamam de a Primavera Brasileira, claramente alusivo à Primavera Árabe, que presenciamos recentemente.

Como sempre, parei e li um bocado a respeito. Pensei um tanto para poder ter assunto para me exprimir, e mesmo assim fui criticado e tratado como tolo. Fazer o quê, né? Se nem Jesus Cristo, que era perfeito, escapou livre das críticas e dos dedos em riste...

Para começo de conversa, sinto-lhe dizerem, mas não, isto não é a Primavera Árabe. Primeiro que estamos no outono, quase inverno, não é ainda primavera =). Segundo que nos países árabes, a luta era contra regimes ditatoriais, totalitários, opressores, que tolhiam entre outras coisas, a liberdade de expressão. Aqui no Brasil, liberdade de expressão é garantida na Constituição (nem sempre respeitada), assim como direito de resposta (que quase nunca tem vez - ou você vê a imprensa dando espaço?) e a responsabilidade jurídica: Abriu a boca, falou o que não deve, ouve o que não quer. Ou pague por isso.

Talvez pudéssemos definir esse movimento como uma Primavera Árabe à Brasileira se vivêssemos ainda no período da ditadura. Se bem que lamentavelmente a polícia, em particular o Batalhão de Choque, pelo visto, não saiu de lá. Mas não, não é uma Primavera Árabe. No máximo um Outono à Brasileira, e olhe lá.

Acho que sempre se fala que o brasileiro é muito passivo, que não reclama de nada... Mas agora resolveu protestar. Isso é bom. Sim, isso é bom! Porque essa autoimagem de povinho passivo pelo visto está mudando. Não acho que seja uma imagem de lá de fora, acho que seja mais autoimagem, o já conhecido nosso "complexo de vira-lata". Brasileiro sempre acha que nós somos piores do que os outros, isso é incutido de tal forma na mente que é difícil romper.

Comigo começou tem uns 10, 12 anos, quando recebi um email de um amigo falando de um monte de coisas boas que tem no Brasil e a imprensa não fala, o brasileiro não sabe, e não é valorizado. E aquilo me fez pensar. Posteriormente comecei a questionar a imprensa, me perguntando: "Mas será que o Governo não faz nada de bom? Será que nada se salva?" O cúmulo foi na crise (outra!) da queda do avião da TAM, em 2007, quando ilibada jornalista (sim, eu estou sendo irônico) falou que o presidente Lula tinha que vir a público falar, alegando que "nos EUA, em situações como essa, o presidente se pronuncia numa cadeia de rádio e TV". Ao que respondi, dentro do meu carro, dirigindo a caminho do trabalho: "Mas isso aqui é Brasil, não é Estados Unidos, catzo!". E rompi com aquela colunista (infelizmente até hoje adorada pela minha mãe) e com a rádio com a qual ela dirige um programa matutino.

Para quem chegou até aqui, entenda: A insatisfação não é o aumento da passagem de ônibus. Sejamos francos: Trem, metrô e barcas subiram, e nem por isso protestaram. Por que tinha que ser logo com os ônibus? 

Aumentos são previstos, correção da inflação. R$ 0,20 traz impacto? Hmmm... Se a pessoa pega 4 ônibus por dia, e faz uso do Bilhete Único (caso aqui do Rio e de outras capitais), o impacto num mês de trabalho é de 8 reais. Alguns vão dizer que é pouco, outros dirão que é muito... Eu não vou discutir quantidades. Mas não vivemos em um mundo onde a economia está parada. Os preços variam, e infelizmente para mais do que eu gostaria que variam.

Tive 7% de aumento de salário esse ano, que é para corrigir a inflação do período. Aliás, esse valor não merece ser chamado de aumento, mas vá lá... Correção, que seja. Logo, preços sobem, e salários sobem (ou deveriam subir, mas isso é outro caso). Teve greve (que eu furei), e que não lutava pelo aumento (na verdade foi de 7% para 8%), mas principalmente era por causa do nosso Plano de Cargos e Salários (PCS), que está parado há tempos. Agora acho que vai.

Voltando aos protestos: Se não é por causa de R$ 0,20, então é o quê? Válvula de escape, gente. Bode expiatório, chamem do que quiserem. Martin Luther King Jr começou seu movimento lutando pela igualdade no sul dos EUA numa questão contra as empresas de ônibus. Parece piada hoje, mas negros não podiam sentar-se em assentos reservados para brancos. E tudo começou ali. Não, gente, o problema não é R$ 0,20.

Para quem ainda não percebeu, o buraco é muito mais embaixo. Esta é a completa insatisfação que a sociedade vive com as instituições. Governo, Igreja, imprensa, mídia tradicional, polícia... E por aí vai.

O Governo é o primeiro alvo. Sempre é. Afinal, falar mal do Governo deveria ser decretado como esporte nacional aqui no Brasil. Não sei como é em outros países, mas acho que não é muito diferente... Afinal, muitos de nós cresceram lendo, vendo e ouvindo que nada que o Governo faz, presta. E o pior, se você acha que tem iniciativas boas, você é tachado de pelego, puxa-saco e chapa-branca para baixo. Eu já passei por isso, porque elogiei algumas iniciativas governamentais. E as palavras usadas não foram nada doces. Provavelmente a pessoa que me rotulou não lê índices do IBGE, só o que o IBOPE informa...

Não precisa ir muito longe, basta abrir qualquer jornal da grande mídia (cada vez mais irrelevante). Todo dia tem uma crise nova. Recentemente tivemos a crise do tomate, agora da crise da queda da popularidade, a "disparada da inflação", a febre amarela (com pessoas tomando superdosagem de vacina e MORRENDO) e tantas outras. Já foi a do mensalão, e tantas outras. Nossa grande imprensa vive de crises sobre crises, e trata de fazer com que muitos pensem que vivemos numa crise constante, o que não é bem assim.

Mas a atual insatisfação vem de muito tempo, e os atuais governos estão pagando o pato. Felizmente ou infelizmente, é a vez deles.

O protesto é lícito e garantido pela Constituição, e como quase toda a população, desaprovo a violência, tanto de manifestantes que danificaram patrimônio público e privado, quanto da truculência da polícia, que não sabe o que é "manter a ordem". Não tem como não lembrar de Desordem, do Titâs... Muito me preocupa ver que em São Paulo tudo começou com quem deveria conter, ao invés de insuflar. Lamentável, Polícia Militar de São Paulo. Seu supremo comandante (o governador Geraldo Alckmin) deveria ser chamado às favas.

O que vai sair daí? Não sei, mas gosto de ver o brasileiro se manifestando, não gosto de ver quebra-quebra nem de policial cometendo atrocidades. Espero que não fique no que foram os "carapintadas" da minha geração, que o único reflexo foi a eleição do presidente da UNE de então para cargo político. Espero que fique algo mais, além da direita usar isso nas eleições de 2014, e dos jovens esquecerem de tudo logo depois do próximo meme da Internet.

Eu sempre digo: Político tem medo de povo. Então, manifestemo-nos, não só na rua, mas também cobrando eles, ligando, mandando e-mail, querendo satisfações... Isso poucos fazem. Isto é cidadania! Se fizéssemos um pouco mais, certamente protestos nas ruas não seriam mais tão necessários.

PS: Sobre protestos, leia esse link aqui e veja o que a imprensa não divulgou.

PS 2: Alguém me diz uma coisa... Teve protesto em Salvador? Não? Hmm... O prefeito é de que partido mesmo? Ah, tá... It makes me wonder...

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23 março 2008

"Coronel, isso vai dar m..."

Nota: Escavando o meu HD, achei alguns textos que redigi para por no blog, mas por diversos motivos (esquecimento é o mais forte deles), não coloquei. Logo, coloco agora o primeiro deles. E segue a programação normal.

Finalmente assisti Tropa de Elite. Demorei por diversos motivos, mas não era porque não queria ver o filme. Afinal, há anos um filme nacional não atrai tanta polêmica, com críticas favoráveis e desfavoráveis, e justamente de pessoas por quem eu tenho respeito. Claro que a minha curiosidade estava atiçada, e, entre outras coisas, queria ver como o Wagner Moura interpretou o autor de frases que já estão eternizadas na memória coletiva do povo brasileiro, como "05, traz o saco!".

Pois é, vi. E vale dizer, adorei o filme. Gostei muito, um dos melhores filmes que vi no ano. Não vou narrar a história, mesmo porque alguns de vocês já devem tê-lo visto mais de uma vez (um ex-aluno da minha escola já assistiu 6 vezes), mas queria deter-me em alguns comentários:

  1. A polícia reclamou do filme, queria evitar que o filme saísse, mas na minha opinião, ao contrário, Tropa de Elite lava a alma da polícia. Mostra a corrupção, que sabemos que tem. Do comandante do batalhão ao guarda de trânsito ("voa aqui, ô marimbondo!"), vemos isso, bem escancarado. Mas mostra também policiais honestos e corretos, como o Neto e o Matias, que fazem o que fazem por vocação, por gosto, porque gostam de ser policiais. E não são só dois policiais, tem muitos como eles, que querem fazer a coisa certa. Tenho um amigo que teve uma má experiência com policiais recentemente (*), e diz que não confia mais em policial nenhum. Eu não sou tão taxativo, mas sei que tem gente boa na polícia, como em qualquer profissão. Não precisa ir muito longe: Certa vez ouvi um professor lá na escola dizendo que pegava aula aos sábados sempre. Aí, ele faltava 3 e trabalhava 1, gozando do direito (que caiu) de 3 faltas por mês. Isso na minha terra chama-se canalhice.
  2. Ao mesmo tempo, o filme expõe a hipocrisia da classe média-alta, que vai para as ruas fazer passeata "pela paz", mas quem alimenta o tráfico (com maconha sendo revendida em faculdades) é esse próprio público, que critica a polícia, mas que acha que "dar um tapinha" não faz mal, é só para consumo próprio... Outro dia ouvi a atriz Cássia Kiss assumindo publicamente que foi usuária de maconha por anos a fio, e dizendo que os lapsos de memória que ela tem hoje em dia são causados pelo uso prolongado da cannabis. E ainda querem liberar as drogas... É bom ouvir que o Capitão Nascimento faz coro com a minha repulsa a essas passeatas tolas e sem sentido, tal qual a do "Cansei!", que não serviu para absolutamente NADA.
  3. O Capitão Nascimento não é um super-homem. Como todo "herói" amargurado, tem problemas em casa. A esposa sai de casa com o filho recém-nascido, e ele fica sozinho. É... Desde o Tenente (e futuro Comissário) James Gordon, de Gotham City, em Batman:Ano Um, isso é recorrente. Clichezão. O treinamento, também é. Mas que é maneiro, é! Qualquer um que viu o Bruce Willis destruindo tudo na série "Duro de Matar" (**), já viu policial se ferrando a mil. Mas o Capitão Nascimento é o novo herói nacional. Com direito a problemas familiares.
E não tem jeito, é o maior sucesso de crítica do cinema brasileiro recentemente. Os atores estão ótimos (o Matias está um pouco fraco), e fiquei particularmente impressionado com o Capitão Fábio (Milhem Cortaz), como ele soa carioca... Sendo que ele é paulista, tendo morado na Itália e tudo. Foi curioso também ver o Caio Junqueira como Neto, e rever uns episódios de Armação Ilimitada, onde ele aparece criança, como um colega do Bacana (Jonas Torres). O filme é desbocado, violento, forte... Mas é muito bom, gostei muito.


(*) Bateram no carro dele, e a causadora do acidente era amiga dos policiais da área. Eles queriam que ele assumisse a autoria da batida, porque ele tinha seguro. Isso é caso para a Corregedoria.

(**) Vi toda a série de novo, só me falta rever o 4o filme (assisti o 1o legendado pela 1a vez na vida).

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